15 dezembro, 2010

Mulher jardineira

Josefa Soares, mentora de um grupo de profissionais voltadas à jardinagem, mostra que terra, minhocas e feminilidade podem andar juntas


Mulheres do Amuja mostram que força física não é fundamental para a jardinagem

A história da fundadora do Grupo de Mulheres Jardineiras começa onde a terra é tão seca que poucas mudas se aventuram a nascer. Cachoeirinha, no sertão de Pernambuco, foi a cidade em que nasceu e se criou Josefa Soares. Primogênita de agricultores analfabetos, ela começou a trabalhar na roça desde cedo, já que “filha mulher não precisa estudar”.


Josefa sempre gostou do trabalho árduo na terra, mas revoltava-se com aquele solo árido, no qual milho, feijão e mandioca só conseguiam brotar com muito esforço. Quando jovem, a futura jardineira bem que tentou tornar a cidade mais verde. Ajudou a criar cooperativas, aprendeu a fazer cisternas e até conseguiu montar uma pequena cultura hidropônica. Mas se cansou de ouvir que “mulher não entende dessas coisas”, e deixou o sertão, rumo ao sudeste.

Na cidade de São Paulo, encontrou terras mais férteis, mas o casamento e a chegada dos filhos acabaram por deixar de lado seus planos temporariamente. Na virada do milênio, com o casamento desfeito, ela decidiu que era hora de correr atrás de seu sonho, e buscou cursos de agronomia. Mas não havia feito o ensino médio, e um diploma universitário estava fora de questão.


No Viveiro Manequinho Lopes, localizado no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, Josefa encontrou o primeiro emprego e a segunda família. Foi adotada por um casal que a acolheu mesmo depois de adulta. Mas isso não marcou o começo de uma vida mais tranquila. “Recebi um convite para fazer um curso de jardinagem, e para isso teria que largar o trabalho”, conta Josefa. “Fui buscar meu Seguro-Desemprego, e ouvi do funcionário que mulheres não podiam ser jardineiras. Foi um choque”.

Sem se deixar abalar, terminou a escola, especializou-se e recebeu um convite do Centro de Cidadania da Mulher de Santo Amaro para ensinar jardinagem às habitantes da região. Lá, encontrou uma enorme diversidade de tipos: mulheres jovens, idosas, com superior completo ou analfabetas. Muitas delas haviam nascido no campo e perdido o contato com a terra ao se mudarem para a cidade, mas agora se encontravam em uma situação econômica instável, e precisavam de uma profissão.


“Algumas mulheres eram vítima de violência doméstica, outras estavam desempregadas, com a confiança abalada. Vi que eu precisaria ser não apenas professora, mas também amiga e psicóloga”, diz Josefa.

Nas aulas, sempre cheias, as alunas demonstravam interesse, e mesmo aquelas com mais idade participavam criando vasos decorados. Ao aprender uma profissão e participar de um grupo com os mesmos interesses, muitas delas ganharam desenvoltura e força de vontade. “Uma moça perdeu 10 quilos, outra criou coragem para confrontar o marido violento”, diz Josefa.


Mas com o passar do tempo, o número de alunas caiu, e Josefa entendeu que era porque elas não conseguiam arcar com o preço das passagens de ônibus, e sofriam críticas da família por trabalhar tanto sem gerar renda. “Nessa hora, entendi que elas precisavam de um emprego”. E assim surgiu o Grupo das Mulheres Jardineiras, que inicialmente era uma associação, daí a sigla Amuja





Terra e batom


“Gosto de trabalhar com a beleza”, diz Dionise de Jesus Soares, uma das nove integrantes fixas do Amuja. A jardineira entrou em contato com a profissão por meio do Projeto Pomar (uma iniciativa da Prefeitura de São Paulo que tem como objetivo a recuperação ambiental das margens do Rio Pinheiros), mas após o seu término, não conseguiu emprego na área. Acabou por montar um salão de cabeleireiro.

Quando as alunas de Josefa decidiram montar o grupo, Dionise não pensou duas vezes, e fechou as portas do salão. “Embelezar pessoas que estão caidinhas ou terrenos que estão destruídos é a mesma coisa. Mas as plantas não reclamam”, diz a jardineira.

No começo, Dionise sofreu o mesmo tipo de preconceito que sua ex-professora. Os homens diziam que ela não ia dar conta do trabalho pesado, carregar sacos de terra ou empurrar o carrinho. Já as mulheres questionavam como alguém com o cabelo sempre arrumado e as unhas feitas poderia mexer com a terra. “E quem disse que não posso ser ao mesmo tempo mulher e jardineira? Levo na bolsa uma pá, mas também um batom e uma lixa de unhas”, conta.

O lema de jardinar sem perder a feminilidade foi passado para as outras integrantes. Um gloss e um lápis de olho fazem parte do uniforme, juntamente com a calça jeans e a camiseta roxa ou verde. Mas aos olhos dos clientes, muitas vezes o feminino é sinônimo de pouca competência. Atualmente, o único parceiro fixo de negócios da Amuja é uma agência de banco. Trabalhos temporários costumam aparecer, e Josefa já indicou membros do grupo para vagas fixas de jardineira.

Embora ainda passem por dificuldades para expandir seus negócios, as integrantes do Amuja demonstram muita determinação. “Eu sei que tenho um caminho pela frente. Quero começar um trabalho com cultivares orgânicos, e juntar dinheiro para fazer uma faculdade de agronomia”, diz Josefa. Mas quando ela pensa em tudo o que já percorreu, vê que já ganhou muitas batalhas em um meio em que nem tudo são flores.

(Num curso de jardinagem que fiz no Pq do Ibirapuera conheci uma dessas mulheres e achei muito legal a iniciativa.)
fonte: globo rural

3 comentários:

  1. Calmamente, tenho vasculhado cada cantinho deste blog e calmamente me encantado a cada passo que dou. São matérias cheias de vida, conteúdo e valiosíssimas informações.
    Foi neste blog que tomei conhecimento da existência da jardinagem libertária e pela qual estou me encantando.Nem fazia idéia que mesma deu início aqui na minha cidade... Incansavelmente parabéns!!!!!!!!!!!!!!!Silvia Pazzinatto

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  2. Sônia Riosjulho 19, 2013

    Como amei o seu blog!Parabéns!
    Me impressiona a sua dedicação e o seu amor pela natureza.
    Senti um extremo bem-estar vendo todos os seus posts.
    Isso é felicidade...
    continue nos alimentando com toda essa beleza.
    Sua página é de extrema sabedoria e profundidade.
    Deixo aqui, meu e-mail: ferreirarios@live.com
    Abraços.

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